domingo, 17 de maio de 2009

CADA CASA
José Adrião

Existe algo em comum nos edifícios da Baixa Pombalina. Como consequência de um Plano, as suas características tipológicas - quer exteriores, quer interiores - apresentam uma grande homogeneidade. As fachadas são idênticas, com ligeiras variações que se relacionam com a especificidade de cada caso, e os interiores têm uma compartimentação perfeitamente reconhecível em praticamente todos os edifícios. Caixa de escadas amplas, vãos de porta com bandeira superior, divisões grandes e semelhantes na sua dimensão, pés direitos altos que permitem a entrada de luz até aos espaços mais recônditos.
Outra particularidade é não existir na sua compartimentação uma hierarquia muito definida. Passa-se de sala para sala, atravessando espaços indiferenciados no seu uso. Depois, e por isso mesmo, estes espaços podem ser muita coisa.
Esta capacidade confere aos edifícios da Baixa Pombalina uma enorme flexibilidade que os torna especialmente dotados para atravessar no tempo diferentes tipos de ocupação adaptando-se a distintas necessidades de uso.
Antes, este edifício já teve casas, escritórios, lojas. Muitas actividades e possíveis narrativas já se desenrolaram no seu interior ao longo de mais ou menos dois séculos.
Agora vazios, ou quase vazios, os diferentes níveis do edifício pressentem-se como espaços intermédios. As imagens na parede, em diferentes condições de luz, revelam-nos acções familiares. Poderiam ter acontecido aqui. São momentos privados, como quase todos dentro de casa e como nas casas que já houve aqui.
Onde queremos a cama? Onde queremos a sala de estar? Onde gostaríamos de comer ou cozinhar?
Para além destes espaços poderem conter diferentes actividades como habitar ou trabalhar, existe também a possibilidade de eleger - de acordo com as circunstâncias - os locais especifícos para o desenrolar de cada acção relacionada com o habitar. A equivalência, ou a não hierarquia, entre os compartimentos permite que a casa se torne num lugar onde todos os espaços podem ser híbridos.
Aqui podem já não existir lugares específicos e pré-determinados para cada acção. O quarto, a sala de jantar, a sala de estar, deixam de ser únicos e definitivos.
E cada lugar, e cada casa, torna-se naquilo que cada um quiser fazer nele.

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